De acordo com a OMS, cerca de 40% da população sofre com algum distúrbio do sono. Conheça os mais comuns (e mais estranhos)
Passamos um terço da vida
dormindo. O que parece uma perda de tempo para muita gente é uma atividade
essencial para a saúde. Durante o sono, o organismo volta à condição na qual
iniciou o dia, com um repouso que inclui relaxamento muscular e redução da
pressão arterial, dos batimentos cardíacos e da produção de urina. É também o
momento de consolidação da memória e de termorregulação, o controle da
temperatura corporal. Além disso, diversos hormônios são fortemente
influenciados pelo sono, como a insulina, que controla a glicose no sangue, a
leptina, responsável pela saciedade, a grelina, que estimula o apetite, e a
somatotrofina, que age no crescimento.
Fábio Maraschin,
pneumologista especializado em medicina do sono, afirma que dormir de forma
adequada é um dos três pilares fundamentais para se ter uma vida saudável - os
outros são exercício físico regular e boa alimentação. Para ele, dormir bem
significa ter ritmo (sono regulado, com um horário para dormir e outro para
acordar), quantidade (varia de pessoa para pessoa) e qualidade, ou seja, um
sono reparador, sem interrupção, que impede a sonolência ao longo do dia.
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- A privação do sono é um
problema sério. Nós vivemos em um mundo maluco, corrido, falta hora para
dormir. E as pessoas acham que não é importante - considera o médico.
Uma pesquisa divulgada em
2009 pela Associação Brasileira do Sono mostrou que 43% dos brasileiros não
tinham um sono restaurador e apresentavam sinais de cansaço no decorrer no dia.
Não se sentir descansado
mesmo após uma noite aparentemente normal pode ser um indicativo de distúrbio,
o que, além de diminuir o bem-estar e a produtividade na rotina, pode levar a
quadros mais graves, como doenças cardiovasculares e depressão.
De acordo com a Organização
Mundial de Saúde, cerca de 40% da população apresenta algum tipo de distúrbio
do sono. Insônia, terror noturno, apneia e sonambulismo são alguns deles.
Conheça os tipos mais comuns e também os mais assustadores.
Paralisia do sono
"Deitando para dormir,
eu me sentia estranhamente exausta. Meus olhos se fechavam, minha boca se
fechava. Tudo desligava, menos minha atenção, minha consciência."
"Eu tinha zero controle
do meu corpo. Não importava o quanto eu tentasse, não conseguia mover meus
braços, minhas pernas."
"Você está acordado,
completamente paralisado, sem conseguir se mexer."
"Eu comecei a ouvir
vozes, gritos e choros."
Os relatos acima poderiam
pertencer à trama fictícia de um filme de terror. Os depoimentos são verídicos,
parte do documentário O Pesadelo, lançado neste ano. Dirigida por Rodney
Ascher, a obra trata da paralisia do sono, um distúrbio relativamente comum,
caracterizado pela total falta de mobilidade do corpo por um momento,
normalmente ao acordar (mais raramente, antes do adormecer), por mais que a
pessoa esteja consciente. Em alguns casos, o fenômeno pode ser acompanhado de
alucinações, motivo suficiente para tornar a realidade assustadora - e o
documentário, composto também por encenações das experiências dos entrevistados,
aterrorizante.
- O cérebro entende que você
ainda está dormindo. A mente acorda, e o corpo, não. Algumas pessoas não
conseguem nem abrir a pálpebra - explica Fábio Maraschin, pneumologista
especializado em medicina do sono.
Não se sabe exatamente o que
leva às alucinações, mas uma das hipóteses é que elas sejam fruto de um estado
de pânico iminente, e o cérebro está hiperalerta. Conforme Luciana Palombini,
médica especialista na área e membro da Associação Brasileira do Sono (ABS), a
paralisia do sono pode acontecer com pessoas saudáveis:
- Ela está bastante
relacionada ao estresse, à falta e à irregularidade do sono. Há estudos que
dizem que é genético.
O fenômeno também é um dos
sintomas da narcolepsia, doença em que a pessoa adormece em momentos
inesperados, causada pelo déficit de um neurotransmissor estimulantes (a
hipocretina) no cérebro.
- Pacientes com narcolepsia
têm intrusão do sono REM quando estão acordados. Há perda de força muscular (a
pessoa pode adormecer e cair), paralisia do sono e sonolência diurna efetiva -
define Fábio.
Luciana afirma que existe
medicação para conter o distúrbio da paralisia do sono, mas, como os efeitos
colaterais são significativos, somente em casos de narcolepsia os remédios
costumam ser indicados. Para quem sofre somente do primeiro mal, a médica
sugere relaxar e tentar movimentar os olhos de um lado para o outro. Ter uma
boa higiene do sono, ou seja, tudo aquilo que envolve a preparação para dormir,
também ajuda.
Respiratórios
A apneia e o ronco são
distúrbios de origem respiratória e também os mais comuns entre toda a
população.
A apneia obstrutiva do sono
é caracterizada por pausas na respiração associadas a repetidas quedas na
quantidade de oxigênio nas artérias durante o sono. A parada (apneia) ou a
redução (hipopneia) do fluxo de ar pelas vias aéreas dura pelo menos 10
segundos. Segundo Fábio Maraschin, cada vez que ocorre uma apneia, o cérebro
estimula a pessoa a acordar e voltar a respirar:
- Ela pode não ter
consciência, mas tem vários microdespertares e o sono fica fragmentado.
Além disso, como entra menos
oxigênio no organismo, o distúrbio aumenta o risco de doenças cardiovasculares.
De 90% a 95% dos casos de
apneia, de acordo com a Associação Brasileira do Sono, são acompanhados por
ronco, problema causado pelo estreitamento ou mesmo obstrução das vias
respiratórias. Sozinho, o problema pode não ser prejudicial, mas serve de
alerta para a apneia.
Luciana Palombini afirma que
a apneia ocorre em todas as idades e todos os gêneros, mas é mais recorrente em
homens de meia-idade com excesso de peso. As crianças apresentam respiração ruidosa, têm sono
agitado e normalmente transpiram muito ao dormir.
- Nelas, o distúrbio pode
causar déficit de atenção - diz.
Sono primeiro, depois
cirurgia
O bancário Luciano Trindade,
39 anos, morador de Cachoeirinha, é diagnosticado com obesidade mórbida. Estava
em busca daquela que seria a última autorização para fazer a cirurgia de
redução de estômago, em outubro do ano passado, quando a esposa comentou ao
médico que o marido roncava muito. Por precaução, foi solicitado a
polissonografia, exame que monitora o sono, e Luciano foi diagnosticado com
apnéia severa - acima de 30 ocorrências em uma hora.
- Durante o dia, quando eu
precisava ficar atento, ficava, mas se era uma atividade mais parada, como uma
reunião, eu dormia mesmo. Ou então se estava pegando carona, o sono vinha muito
rápido - contou.
A redução de estômago foi
adiada. Fabio Maraschin justifica que o ideal, para se fazer qualquer
procedimento cirúrgico, é que o paciente esteja o mais saudável possível. No
caso de Luciano, o risco seria maior porque as células e o organismo como um
todo estariam menos oxigenados.
- Além disso, depois dessa
cirurgia, o paciente tem que estar disposto a seguir um plano de alimentação e
exercício. Se ele não dorme direito, pode ficar sem disposição para isso -
concluiu.
Foi recomendado que Luciano
usasse o aparelho Cpap (aparelho de pressão positiva), uma máscara que auxilia
na respiração, por quatro meses, mas ele acabou usando durante um ano.
- Demorei para marcar a
cirurgia e segui usando. A qualidade do sono, tanto minha quanto da minha
mulher, melhorou muito - opinou Luciano.
Terror noturno
Mais comum entre as
crianças, o terror noturno é uma parassonia - distúrbios de movimentos anormais
durante o sono - em que o indivíduo grita, como se estivesse sendo atacado.
Depois, ele acorda desesperado. Os episódios costumam ter duração de um a três
minutos.
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O problema não é sinônimo de
pesadelo, situação na qual a pessoa acorda ao se assustar e sentir medo. No
terror noturno, os gritos e a agitação ocorrem quando se está dormindo. Além
disso, os pesadelos ocorrem no sono REM e o terror noturno, no não-REM.
Sexomnia
A sexomnia também é um tipo
de parassonia. A pessoa que sofre desse distúrbio tem comportamentos sexuais
enquanto dorme. Ela não percebe que está fazendo tais atividades (normalmente,
masturbação) e, quando acorda, não lembra do ocorrido. Rara, a síndrome passou
a ser classificada como um distúrbio do sono recentemente.
- É um sonambulismo com
comportamento sexual. O tratamento pode ser comportamental ou com medicação -
explica Luciana.
Esse distúrbio ocorre
durante o estado de sono não-REM.
Também classificado como
parassonia com manifestação no estado não-REM, o transtorno se caracteriza pela
realização de atividades motoras sem que o indivíduo tenha total consciência do
que faz. Parte de suas funções cerebrais continua adormecida, e ele fica em um
estado de transição entre o sono e a vigília.
Normalmente, os episódios
ocorrem uma ou duas horas depois que a pessoa adormeceu, duram de poucos
segundos a meia hora e terminam quando ela acorda ou volta para cama para
continuar dormindo. Na manhã seguinte, a pessoa não lembra ou recorda muito
pouco do que aconteceu.
Transtorno alimentar noturno
Outra parassonia, o
transtorno alimentar noturno envolve ingestão calórica durante o sono, ou seja,
a pessoa se levanta para comer. Nesse distúrbio, a pessoa também não tem plena
consciência do que está fazendo e pode não lembrar do episódio no dia seguinte.
Luciana salienta que é
importante realizar uma polissonografia (exame do sono), pois, em alguns casos,
o paciente pode apresentar outras síndromes. O tratamento inclui medicação e
mudanças comportamentais.
Síndrome das pernas
inquietas
Entre os distúrbios do sono
mais comuns também está a síndrome das pernas inquietas - segundo a Associação
Brasileira da Síndrome das Pernas Inquietas, estima-se que o problema acometa
5% da população geral e 15% da mundial adulta.
Nela, o indivíduo queixa-se
de um desconforto nas pernas quando vai repousar, o que leva a uma necessidade
compulsiva de mexê-las. Movimentos involuntários nos membros inferiores durante
o sono e a vigília também ocorrem em aproximadamente 80% dos casos.
O distúrbio pode ter
diferentes causas. Uma delas é genética, quando o problema é chamado de
primário ou familiar. Anemia e baixos níveis de ferro no sangue já foram
associados a esses sintomas, assim como outras doenças crônicas (problemas
neurológicos e renais) e transtornos de hiperatividade e déficit de atenção.
Algumas mulheres desenvolvem a síndrome das pernas inquietas durante a
gravidez.
Insônia
Outro problema frequente é a
insônia, caracterizada pela incapacidade de iniciar ou manter o sono.
Geralmente causada por hábitos inadequados, ela pode estar relacionada a
distúrbios do humor, como ansiedade e depressão - segundo Fábio Maraschin, é
difícil identificar qual dos dois vem primeiro.
Se os sintomas ocorrerem
pelo menos três vezes por semana e por mais de três meses, a pessoa tem um
quadro crônico. De acordo com Luciana, a insônia é mais comum entre as
mulheres:
- Essa incidência está
relacionada a questões hormonais e também comportamentais. O público feminino
tem tendência de culminar pensamentos durante a noite.
A especialista afirma que a
insônia é o terceiro maior motivo de procura por ajuda médica quando o assunto
é sono. Para o tratamento, normalmente é necessária uma mudança na rotina, como
reduzir estímulos ao cérebro durante a noite, diminuir a luminosidade, não
trabalhar em horários próximos ao de dormir e evitar cafeína.
Fonte: Gauchazh
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