O anúncio da retirada do
Brasil do Pacto Global para a Migração, assinado por 150 países da Organização
das Nações Unidas (ONU), feito esta semana pelo presidente Jair Bolsonaro, vai
na contramão de algumas propostas que tramitam no Senado para facilitar a vida
de imigrantes estrangeiros no país e de brasileiros no exterior. Outras, mais
restritivas, buscam dar resposta às demandas causadas pelas últimas levas de
refugiados recebidas pelo Brasil, como é o caso dos venezuelanos, especialmente
no estado de Roraima.
Mais alinhado com a
iniciativa da ONU, projeto do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) dispensa
a autorização de residência prévia para emissão de visto temporário para
estrangeiros que venham para o Brasil. O PLS 491/2017 tenta resgatar um dos
pontos do texto da Lei da Migração (Lei 13.445, de 2017), em parte alterada
pelo decreto que o governo do ex-presidente Michel Temer editou para regulamentá-la.
“Dentre os retrocessos desse
decreto de regulamentação está a concepção de que os vistos temporários para
pesquisa, ensino ou extensão acadêmica; para trabalho; para realização de
investimento ou de atividade com relevância econômica, social, científica,
tecnológica ou cultural; e para atividades artísticas ou desportivas com
contrato por prazo determinado dependem de deferimento do Ministério de
Trabalho [extinto pelo governo Bolsonaro] de autorização de residência prévia
”, aponta Fernando Bezerra.
Conforme argumenta o
senador, a Lei de Migração promoveu nova concepção sobre a entrada e estadia de
investidores migrantes no território nacional, inclusive com relação à previsão
de visto temporário para quem promover investimento ou atividade com relevância
econômica, social, científica, tecnológica ou cultural.
Sobre o visto para a
realização de investimento, Bezerra Coelho observa que a lei aprovada pelo
Congresso prevê que o visto poderia ser concedido a quem aporte recursos em
projeto com potencial para geração de empregos ou de renda no país. A medida em
sua avaliação pode dar um impulso na economia:
“Tomemos, como exemplo, o
visto especial para investidor, que vários países concedem a fim de que
empreendedores se estabeleçam em seus territórios ou transitem sem a
necessidade de recorrerem a pedidos rotineiros de vistos. O Golden Visa de
Portugal e de outros países europeus são exemplos disso. Essa realidade
estimula investimentos de toda ordem”, exemplificou.
Para o senador, o ideal
seria que a gestão dos pedidos de vistos se concentrasse nos consulados,
evitando custos e burocracia. “O decreto de regulamentação desvirtua o conceito
de incentivo ao investidor, para visto e autorização de residência, e amarra
sua concessão à velha burocracia brasileira".
O projeto está na Comissão
de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde aguarda escolha de relator.
Trabalho no exterior
Já uma proposta do senador
Armando Monteiro (PTB-PE) visa beneficiar o outro lado da história: brasileiros
que querem trabalhar no exterior. Empresas nacionais ou estrangeiras que atuem
no Brasil poderão ter facilitada a transferência ou contratação desses
brasileiros para missões ou trabalhos fora do país. O PLS 138/2017 busca
atualizar a legislação vigente para desonerar a contratação desses
funcionários.
A proposição tramita na
Comissão de Assuntos Sociais (CAS) em decisão terminativa, com relatoria do
senador Jorge Viana (PT-AC). Se aprovado na comissão, segue direto para exame
da Câmara dos Deputados, a não ser que haja recurso dos senadores para apreciação
em Plenário. O projeto já foi aprovado na Comissão de Relações Exteriores e
Defesa Nacional (CRE), onde também foi relatado pelo senador pelo Acre.
No entender do relator, a
legislação atual contribui para a perda de postos de trabalho especializados,
prejudica a internacionalização das empresas nacionais e retira oportunidades
de cidadãos brasileiros, que antes eram transferidos por suas próprias empresas
para o exterior, o que já não ocorre atualmente devido a encargos extras e
insegurança jurídica.
— Esse projeto é a
regulamentação da conhecida Lei Mendes Júnior, que é de 1982 [Lei 7.064]. Para cada brasileiro que conseguir trabalhar
numa empresa brasileira no exterior, certamente são vagas que se abrem aqui no
Brasil — destacou o senador.
Territorialidade
O texto define ainda que a
legislação trabalhista aplicável é a do local da prestação de serviços, como
ocorre na grande maioria dos países pelo chamado princípio da territorialidade.
Resguarda, ainda, a aplicabilidade da lei brasileira no tocante aos
recolhimentos para a Previdência Social, o Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço
(FGTS) e o Programa de Integração Social (PIS).
Uma alteração importante é a
desoneração das empresas do pagamento dos encargos trabalhistas e
previdenciários sobre a parcela paga ao empregado em razão de sua transferência
ao exterior, o que eleva muito o custo da contratação de brasileiros para esses
postos de trabalho.
Outro ponto relevante é o
aumento do prazo de transferência provisória para o exterior para um ano sem
que haja a aplicação do regime da Lei de Expatriação (outro apelido da Lei
Mendes Júnior). Atualmente esse prazo é de 90 dias, período insuficiente tanto
para a adaptação do empregado quanto para a prospecção comercial.
O projeto inova ao
possibilitar a conversão da transferência do empregado de transitória para
definitiva após sua permanência no exterior por prazo superior a três anos.
Venezuela
A intensa migração de
venezuelanos para o Brasil, especialmente pela fronteira com Roraima, no
entanto, motivou a apresentação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 408/2018,
para limitar o ingresso e a permanência de estrangeiros. A proposição, do
senador Romero Jucá (MDB-RR), está na pauta da Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania (CCJ), e terá votação final na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional (CRE).
O senador propôs mudanças na
Lei de Migração e na Lei 9.474, de 1997, o Estatuto dos Refugiados. As regras
deverão valer para quem vem para o Brasil na condição de refugiado ou em busca
de acolhimento humanitário.
“De agora em diante, haverá
ordem, critérios e equilíbrio na recepção, na acomodação e na permanência de
imigrantes e refugiados, a exemplo de limites para o ingresso de estrangeiros
no país. O poder público federal fará a sua parte, provendo os meios
necessários à recepção e à acomodação dessas pessoas, assim como se exigirá que
todos os estados, além do Distrito Federal, participem desse esforço
humanitário, distribuindo o ônus de fazê-lo entre si”, sustentou Jucá na
justificação do projeto.
Ao mesmo tempo em que coloca
a União no comando de um esforço nacional de acolhimento desses estrangeiros, o
projeto estabelece deveres a serem cumpridos por quem está entrando no país.
Assim, a cobrança é de que o acolhido ou refugiado se comporte “nos estreitos
limites” da legislação brasileira. Jucá assinala que “as leis são para todos,
independentemente da origem ou nacionalidade da pessoa”.
Linha dura
Essa tendência de
endurecimento nas regras já é sinalizada na abertura do PLS 408/2018. Pela
proposta, o Estatuto dos Refugiados deverá contar com a hipótese de expulsão do
país de refugiado ou peticionário de refúgio condenado, em decisão final da
Justiça, por qualquer tipo de crime praticado em território nacional, e ainda
por motivo de segurança nacional ou ameaça à ordem pública.
A proposta também altera
dispositivo da Lei de Migração que reúne as causas para expulsão de migrante ou
visitante do país. Em sintonia com o Estatuto do Refugiado, a Lei 13.445, de
2017, passará a tomar como motivação a prática de qualquer crime em território
brasileiro com condenação já confirmada pela Justiça.
Capacidade de absorção
Pelo texto, a União deve
definir, em conjunto com os entes federados, critérios para avaliar a
capacidade de absorção de peticionários de refúgio e refugiados. Essa decisão
deverá levar em conta, por exemplo, oferta de empregos; renda per capita;
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH); disponibilidade de serviços públicos e
leitos hospitalares.
A iniciativa também assegura
à União, aos estados e ao Distrito Federal definir o contingente máximo de
migrantes que poderão permanecer no país, seja na condição de refugiado ou
mediante acolhida humanitária. A intenção é condicionar o pedido de refúgio ou
acolhimento à capacidade de recepção e acomodação de estrangeiros pelo Brasil.
Ao recomendar a aprovação do
PLS 408/2018, o relator na CCJ, senador Valdir Raupp (MDB-RO), considerou a
matéria digna de louvor.
“O poder público federal
fará sua parte, provendo os meios necessários à recepção e à acomodação dessas
pessoas, bem como exigirá que os estados e o Distrito Federal participem desse
esforço humanitário, distribuindo o ônus de fazê-lo entre si”, destacou
Raupp
no parecer.
Entretanto, três votos em
separado pela rejeição do PLS 408/2018 foram apresentados à Comissão de Justiça
pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Rose de Freitas (Pode-ES) e pela
ex-senadora Regina Sousa.
Fonte: Agência Senado
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